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RQE pela Via Judicial: quando é possível e como funciona

  • Foto do escritor: Ricardo Stival
    Ricardo Stival
  • há 1 dia
  • 3 min de leitura

O Registro de Qualificação de Especialista (RQE) é um elemento fundamental na trajetória de muitos médicos. Trata-se de documento emitido pelos Conselhos Regionais de Medicina que formaliza a habilitação do profissional em uma especialidade específica, conforme os critérios definidos pelas normas do Conselho Federal de Medicina.



Na prática, ele funciona como um marco regulatório e de legitimidade para a atuação médica em determinada área. Quando há negativa do CRM à emissão do RQE, mesmo diante de uma formação técnica compatível, é possível buscar o reconhecimento pela via judicial — com base na razoabilidade, na equivalência formativa e no princípio da legalidade, obviamente, dependendo de cada caso específico.


O RQE não é apenas um número no registro do médico. Ele representa o reconhecimento oficial da sua qualificação como especialista. Sem ele, o médico está impedido de divulgar a especialidade em materiais profissionais, carimbos, receituários, sites e sobretudo redes sociais. Além disso, pode encontrar dificuldades concretas para atuar em hospitais, clínicas credenciadas e operadoras de saúde que exigem o registro como pré-requisito para contratação ou manutenção no corpo clínico.


Mesmo profissionais que cursaram especializações de alto nível, com estrutura semelhante à da residência médica, enfrentam obstáculos se a formação não estiver formalmente vinculada ao SisCNRM (Sistema da Comissão Nacional de Residência Médica). Essa lacuna entre a prática e a formalidade é onde a via judicial encontra espaço de atuação.


Quando o Poder Judiciário reconhece o direito ao RQE?


A Justiça Federal tem consolidado o entendimento de que a ausência de vínculo com o SisCNRM não deve ser um impeditivo automático à obtenção do RQE, quando há equivalência material na formação. O foco se desloca da formalidade burocrática para a comprovação substancial da qualificação do médico.


Em decisões recentes, reconheceu-se o direito de médicos que realizaram especializações estruturadas em instituições hospitalares com supervisão e carga horária compatíveis com a residência oficial, mesmo que não tenham sido registrados como residentes formais.


O que o Judiciário avalia, nesses casos, é a real capacidade técnico-científica do médico, amparada por documentos e comprovações que demonstrem a compatibilidade entre sua formação e os parâmetros exigidos pelas diretrizes nacionais da especialidade.


A robustez probatória é o pilar central da demanda. A concessão judicial do RQE exige que o médico demonstre, de maneira clara e objetiva, que sua formação atende aos critérios exigidos para a especialidade. Entre os documentos mais relevantes, destacam-se:


  • Certificados e declarações detalhadas emitidos pela instituição onde ocorreu a formação, informando carga horária, disciplinas cursadas, práticas realizadas e supervisão médica;


  • Comparação com a grade curricular da residência reconhecida pelo MEC;


  • Aprovação em prova de título pela sociedade médica da especialidade (quando disponível);


  • Relatórios ou registros de atuação prática, como prontuários, exames assinados e participação em procedimentos;


  • Declarações de preceptores, coordenadores de programa e colegas que atuaram na mesma estrutura.


Quanto mais detalhadas forem essas provas e mais explícita for a demonstração da equivalência prática com a residência médica, maiores as chances de êxito na ação judicial.


Ter o RQE é muito mais do que uma formalidade. Ele oferece segurança jurídica, credibilidade profissional e respaldo para atuar plenamente como especialista.


Por outro lado, sua ausência pode gerar limitações significativas, mesmo para médicos com sólida experiência prática. A seguir, algumas consequências práticas dessa distinção:


Vantagens de ter o RQE:


  • Permite a divulgação da especialidade médica de forma legal e ética;


  • Facilita o credenciamento em hospitais, clínicas e operadoras de saúde;


  • Amplia oportunidades profissionais, inclusive em concursos e contratos públicos;


  • Confere legitimidade ao ato médico especializado, protegendo o profissional de acusações de exercício irregular;


  • Transmite maior segurança aos pacientes e ao mercado sobre a qualificação técnica do médico.


Desvantagens de não ter o RQE:


  • Proibição de divulgação da especialidade, sob pena de infração ética;


  • Dificuldade para ser incluído em escalas ou plantões especializados;


  • Restrições para credenciamento junto a planos de saúde;


  • Risco de questionamento legal ou ético em caso de complicações em atendimentos especializados;


  • Perda de competitividade no mercado de trabalho, mesmo com formação técnica adequada.


Ou seja, mesmo que o médico atue há anos na área, a ausência do RQE limita formalmente sua atuação e pode gerar entraves administrativos, jurídicos e éticos.


Por isso, a busca judicial pelo RQE deve ser conduzida com estratégia, cautela e domínio técnico. Não se trata de um pedido genérico ao Judiciário, mas de um requerimento que desafia um ato administrativo formal, exigindo argumentação jurídica precisa e provas bem organizadas.


Esse tipo de ação tem ganhado força nos últimos anos como mecanismo de reparação institucional e valorização do mérito técnico, oferecendo a médicos qualificados uma via legítima de reconhecimento formal diante das limitações do sistema administrativo atual.

Ricardo Stival é Advogado, Professor de Pós-Graduação de Direito Médico,  Especialista em Ações Judiciais de Erro Médico, Sindicâncias e Processos Éticos no CRM e CRO, com atuação em todo o Brasil
Ricardo Stival - Advogado de Direito Médico

Ricardo Stival - Advogado e Professor de Direito Médico

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