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DENÚNCIA NO CRM

A denúncia no CRM é realizada por qualquer pessoa, desde que não seja anônima, ou até mesmo de ofício pelo próprio Conselho Regional de Medicina.

 

Dessa forma, cabe ao CRM por um conselheiro sindicante, analisar a denúncia e abrir uma sindicância contra o médico envolvido, tendo como objetivo principal buscar informações para que sejam esclarecidos os fatos alegados na denúncia.

Cumpre salientar, que tal fase inicial, ou seja, denúncia seguida de uma sindicância, não se trata de uma fase processual, portanto, é muito importante que todos os elementos de prova e argumentos jurídicos sejam apresentados de maneira formal ao CRM, já que é nesse momento que o médico pode buscar satisfazer o conselheiro sindicante com as informações fornecidas, buscando o devido arquivamento da denúncia.

Muitas vezes essa fase da sindicância é menosprezada, porém, é a mais importante em todo o trâmite dentro do CRM, já que não há qualquer risco de punição em uma sindicância, porém, instaurado em processo ético-profissional, as consequência podem ser enormes, tanto afetando o prestígio profissional do médico quanto a própria atividade médica perante a sociedade.

O que é uma Denúncia no CRM?

A denúncia no Conselho Regional de Medicina (CRM) é o ato formal pelo qual qualquer pessoa, física ou jurídica, ou o próprio Conselho, leva ao conhecimento da autarquia fatos que podem configurar infração ética por parte de um médico. É fundamental que a denúncia não seja anônima, garantindo a seriedade e a possibilidade de apuração dos fatos. O CRM, ao receber a denúncia, atua como um órgão de fiscalização e julgamento ético-profissional, visando a proteção da sociedade e a manutenção da boa prática médica.

 

Como a Denúncia é Apresentada?

A denúncia deve ser formalizada por escrito, seja de forma manuscrita ou digitada, e devidamente assinada pelo denunciante. Deve conter uma descrição clara e circunstanciada dos fatos, incluindo datas, locais, nomes dos envolvidos e, se possível, provas documentais ou testemunhais. A denúncia é direcionada ao Presidente ou à Corregedoria do CRM da jurisdição onde os fatos ocorreram. Muitos CRMs disponibilizam formulários específicos em seus sites para facilitar o processo.

 

A Fase da Sindicância

Após o recebimento da denúncia, o CRM designa um conselheiro sindicante para analisar o caso e instaurar uma sindicância. Esta fase é crucial e, como bem destacado, não se trata de um processo ético-profissional, mas sim de uma etapa preliminar de investigação. Seu objetivo é coletar informações, esclarecer os fatos e verificar a existência de indícios de infração ética que justifiquem a abertura de um processo.

 

É nesse momento que o médico denunciado tem a oportunidade de apresentar sua versão dos fatos, juntar documentos, indicar testemunhas e, de forma estratégica, demonstrar a improcedência da denúncia ou a ausência de conduta antiética. A sindicância é a porta de entrada para a defesa, e sua condução adequada pode resultar no arquivamento da denúncia, evitando a instauração de um processo ético-profissional, que, por sua natureza, já carrega um estigma e pode gerar consequências mais graves.

O Código de Ética Médica e a Denúncia

O Código de Ética Médica (CEM), aprovado pela Resolução CFM nº 2.217/2018, é o pilar que rege a conduta dos profissionais da medicina no Brasil. Ele estabelece os princípios fundamentais, as normas diceológicas (direitos dos médicos), as normas deontológicas (deveres dos médicos) e as disposições gerais que orientam o exercício da profissão. Uma denúncia no CRM, em sua essência, busca verificar se houve transgressão a alguma dessas normas, especialmente as deontológicas, que são passíveis de sanções disciplinares.

É crucial compreender que o CEM não é apenas um conjunto de regras punitivas, mas um guia para a boa prática médica, visando a proteção do paciente e a valorização da profissão. Ao analisar uma denúncia, o CRM se baseia nesses preceitos para julgar a conduta do médico, sempre considerando o contexto e as particularidades de cada caso.

 

O Processo Ético-Profissional

Caso a sindicância identifique indícios de infração ética, o CRM instaura um Processo Ético-Profissional (PEP). Esta fase é de natureza processual, com rito e prazos definidos, garantindo ao médico o direito ao contraditório e à ampla defesa. O PEP é conduzido por um conselheiro relator, que colhe provas, ouve testemunhas e, ao final, emite um parecer.

 

O julgamento é realizado por um plenário de conselheiros, que decide pela absolvição ou pela aplicação de uma das penalidades previstas em lei, que vão desde uma advertência confidencial até a cassação do exercício profissional.

As implicações de um PEP são significativas, tanto para a reputação do médico quanto para sua carreira. Mesmo que o resultado seja o arquivamento ou a absolvição, o processo em si pode gerar desgaste emocional e profissional. Por isso, a atuação estratégica desde a fase da sindicância é fundamental para evitar que a denúncia evolua para um PEP.

A Importância da Defesa Estratégica na Sindicância

A fase da sindicância, muitas vezes subestimada, é o momento mais oportuno para o médico exercer sua defesa de forma estratégica. Diferentemente do processo ético-profissional, a sindicância não tem caráter punitivo, mas sim investigativo. É a chance de esclarecer os fatos, apresentar documentos, e demonstrar que a conduta médica esteve em conformidade com o Código de Ética Médica e as boas práticas da profissão. Um parecer bem fundamentado do conselheiro sindicante, embasado nas informações e provas apresentadas pelo médico, pode levar ao arquivamento da denúncia, evitando todo o desgaste e as possíveis consequências de um processo.

É fundamental que o médico não encare a sindicância como uma mera formalidade. Pelo contrário, é o momento de agir proativamente, preferencialmente com o auxílio de um profissional especializado em direito médico. A defesa deve ser técnica, clara e objetiva, focando nos aspectos éticos e legais da situação.

 

A apresentação de prontuários completos, laudos, exames e quaisquer outros documentos que corroborem a versão do médico é crucial. Além disso, a indicação de testemunhas que possam atestar a conduta profissional e ética do médico pode fortalecer significativamente a defesa.

Casos Práticos e Jurisprudência

A análise de casos práticos e da jurisprudência dos Conselhos de Medicina e dos tribunais superiores revela a complexidade das denúncias e a importância de uma defesa robusta. Em muitos casos, denúncias que inicialmente pareciam graves foram arquivadas após a apresentação de uma defesa consistente na fase da sindicância. Por outro lado, a negligência ou a subestimação dessa fase pode levar à instauração de processos éticos, mesmo em situações onde a infração não era evidente.

Um exemplo comum envolve denúncias de erro médico. A jurisprudência tem demonstrado que a mera ocorrência de um resultado indesejado não configura, por si só, erro médico. É necessário comprovar a falha na conduta profissional, seja por imperícia, imprudência ou negligência. Nesses casos, a apresentação de laudos periciais, pareceres de especialistas e a demonstração de que todos os protocolos e boas práticas foram seguidas são elementos essenciais para a defesa.

Outro ponto relevante é a questão da denúncia anônima. Embora a legislação dos CRMs não aceite denúncias anônimas para a instauração de processos éticos, é possível que o Conselho, ao tomar conhecimento de fatos graves por meio de denúncias anônimas, decida investigar de ofício. Nesses casos, a investigação se inicia por iniciativa do próprio CRM, e o médico terá as mesmas oportunidades de defesa.

A jurisprudência também tem abordado a questão da prescrição. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que a representação ético-disciplinar formulada contra médico no CRM não suspende o prazo prescricional para uma eventual ação de danos morais na esfera cível. Isso reforça a necessidade de o médico estar atento a todas as esferas de responsabilização e buscar a defesa adequada em cada uma delas.

​A denúncia no CRM, embora seja um momento de apreensão para qualquer médico, não deve ser encarada como uma sentença. Pelo contrário, é um procedimento que visa garantir a ética e a qualidade da medicina, protegendo tanto a sociedade quanto os próprios profissionais. A chave para enfrentar uma denúncia com confiança reside na compreensão do processo, na preparação adequada da defesa e na atuação proativa desde a fase da sindicância.

Ao ter conhecimento dos seus direitos e deveres, ao manter prontuários completos e organizados, e ao buscar o apoio de profissionais especializados, o médico estará mais preparado para demonstrar a correção de sua conduta e preservar sua reputação e seu exercício profissional. A sindicância é a sua grande oportunidade de esclarecer os fatos e buscar o arquivamento da denúncia, antes que ela se transforme em um processo ético-profissional com implicações mais severas. A confiança do médico em sua própria conduta e a preparação para a defesa são os pilares para superar esse desafio com êxito.

Ricardo Stival é Advogado, Professor de Pós-Graduação de Direito Médico,  Especialista em Ações Judiciais de Erro Médico, Sindicâncias e Processos Éticos no CRM e CRO, com atuação em todo o Brasil
Ricardo Stival - Direito Médico

Ricardo Stival - Advogado e Professor de Direito Médico

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