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Falta, Desistência e Dúvidas de Plantão Médico

  • Foto do escritor: Ricardo Stival
    Ricardo Stival
  • 1 de mai. de 2020
  • 25 min de leitura

Atualizado: 23 de jun.

A prática médica em regime de plantão representa uma das modalidades mais desafiadoras e responsáveis da medicina contemporânea. Em um cenário onde a continuidade do cuidado pode significar a diferença entre a vida e a morte, as questões relacionadas à falta, desistência e dúvidas sobre plantões médicos assumem uma dimensão que transcende aspectos meramente administrativos, adentrando profundamente no terreno da ética profissional e da responsabilidade legal.


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Você, como médico plantonista, já se questionou sobre as implicações de uma ausência não programada? Ou sobre os procedimentos corretos para comunicar uma desistência definitiva de plantões? Estas não são apenas questões práticas do dia a dia profissional, mas dilemas que envolvem princípios fundamentais da medicina, responsabilidades éticas incontornáveis e consequências legais que podem impactar significativamente sua carreira.

 

O presente artigo surge da necessidade premente de esclarecer essas questões complexas que afligem diariamente milhares de médicos plantonistas em todo o país. Baseado em uma análise rigorosa do Código de Ética Médica, das resoluções do Conselho Federal de Medicina e da jurisprudência consolidada sobre o tema, este guia oferece respostas fundamentadas para os principais questionamentos que permeiam a prática do plantão médico.

 

Mais do que um simples manual de procedimentos, este trabalho pretende ser uma ferramenta de reflexão e orientação prática, reconhecendo as ansiedades e incertezas que naturalmente surgem quando nos deparamos com situações imprevistas ou dilemas éticos no exercício da medicina de urgência e emergência. Afinal, compreender profundamente nossas responsabilidades não é apenas uma questão de cumprimento normativo, mas um pilar fundamental para o exercício de uma medicina segura, ética e de qualidade.


O plantão médico não constitui meramente uma atividade laboral comum, mas sim um compromisso profissional revestido de características especiais que o distinguem de outras modalidades de trabalho médico. Quando um médico aceita integrar uma escala de plantão, ele assume responsabilidades que vão muito além da simples prestação de serviços, estabelecendo um vínculo ético e legal com a instituição, com seus colegas e, principalmente, com os pacientes que necessitarão de cuidados durante o período sob sua responsabilidade.

 

O Código de Ética Médica, em seu artigo 9º, estabelece de forma cristalina que é vedado ao médico "deixar de comparecer a plantão em horário preestabelecido ou abandoná-lo sem a presença de substituto, salvo por justo impedimento". Esta disposição não é meramente formal, mas reflete um princípio fundamental da medicina: a continuidade do cuidado como garantia da segurança do paciente.

 

Mas o que exatamente significa este "justo impedimento"? Como podemos distinguir entre uma situação que justifica eticamente a ausência e aquela que configura abandono de plantão? Estas questões, aparentemente simples, envolvem uma análise cuidadosa das circunstâncias concretas e dos princípios éticos que norteiam nossa profissão.


Responsabilidade Pessoal e Intransferível


Um dos pilares fundamentais da ética médica é o princípio da responsabilidade pessoal, claramente estabelecido no parágrafo único do artigo 1º do Código de Ética Médica: "A responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida". Este princípio assume particular relevância no contexto dos plantões médicos, onde a responsabilidade pelo cuidado dos pacientes é claramente delimitada no tempo e no espaço.

 

Quando você assume um plantão, torna-se pessoalmente responsável por todos os pacientes que estiverem sob seus cuidados durante aquele período. Esta responsabilidade não pode ser delegada, transferida ou presumida por terceiros. Ela é sua, integralmente, e permanece assim até que seja formalmente transferida para outro médico devidamente habilitado.

 

Esta compreensão é fundamental para entendermos por que o abandono de plantão é considerado uma das infrações éticas mais graves na medicina. Não se trata apenas de uma questão disciplinar ou administrativa, mas de uma violação direta do princípio da continuidade do cuidado, que pode colocar vidas em risco.


A Responsabilidade Compartilhada


Embora a responsabilidade médica seja sempre pessoal, é importante compreender que a organização e manutenção das escalas de plantão não é responsabilidade exclusiva dos médicos plantonistas. A Resolução CFM nº 2.147/2016 estabelece claramente que "a ausência de profissionais médicos nos plantões é da responsabilidade dos gestores (diretor técnico e clínico), visto que estes responderão ética e juridicamente pelas ausências".

 

Esta disposição cria um sistema de responsabilidade compartilhada, onde o médico plantonista tem a obrigação de comparecer ao plantão ou comunicar adequadamente sua impossibilidade, enquanto a direção técnica tem a responsabilidade de garantir a cobertura médica adequada do serviço. O parágrafo único do artigo 9º do Código de Ética Médica reforça esta responsabilidade ao estabelecer que "na ausência de médico plantonista substituto, a direção técnica do estabelecimento de saúde deve providenciar a substituição".

 

Mas como esta responsabilidade compartilhada funciona na prática? Quais são os limites de cada responsabilidade? E o que acontece quando há falha em algum dos elos desta cadeia de responsabilidades?


Situações Práticas e Casos Específicos


A vida é imprevisível, e situações extraordinárias podem surgir a qualquer momento, colocando o médico plantonista diante de dilemas práticos e éticos complexos. O conceito de "justo impedimento", mencionado no artigo 9º do Código de Ética Médica, não é definido de forma taxativa pela legislação, exigindo uma análise cuidadosa de cada situação concreta.

 

O Parecer CRM-PR nº 1.802/2006 oferece importantes diretrizes para a caracterização do caso fortuito ou força maior, definindo-os como aqueles em que "de maneira imprescindível os efeitos não possam ser evitados ou impedidos pelo devedor". Mas o que isso significa na prática do dia a dia médico?

 

Imagine que você está a caminho do hospital para assumir seu plantão quando é envolvido em um acidente de trânsito. Ou que um familiar próximo sofre uma emergência médica grave exatamente no horário em que deveria iniciar suas atividades. Ou ainda que uma tempestade severa torna impossível o deslocamento até a instituição de saúde. Estas situações configuram força maior?

 

A resposta não é simples e requer uma análise objetiva de cada caso. O parecer citado estabelece que deve ser avaliada "objetivamente a impossibilidade do cumprimento da obrigação, cujos efeitos não sejam possíveis de impedir e não apenas a consideração abstrata de tal impossibilidade". Em outras palavras, não basta alegar impossibilidade; é necessário demonstrar concretamente que a situação estava além do controle do médico e que não havia meios razoáveis de evitá-la ou contorná-la.


A Questão da Comunicação Prévia: Quando e Como Avisar


Uma das dúvidas mais frequentes entre médicos plantonistas refere-se ao prazo e à forma adequada de comunicar uma impossibilidade de comparecimento. O artigo original menciona a necessidade de comunicação com "antecedência mínima de 24 a 48 horas", mas esta orientação merece uma análise mais aprofundada.

 

A exigência de comunicação prévia não é meramente burocrática, mas reflete princípios fundamentais de responsabilidade profissional e respeito aos colegas. Quando você comunica com antecedência sua impossibilidade de comparecer, permite que a direção técnica e seus colegas se organizem para garantir a continuidade do atendimento, evitando a exposição dos pacientes a riscos desnecessários.

 

Mas e quando a impossibilidade surge de forma súbita? Como proceder quando um impedimento surge poucas horas antes do plantão, ou mesmo durante o plantão? Nestas situações, a comunicação deve ser imediata, acompanhada de todas as informações necessárias para que a direção técnica possa tomar as providências cabíveis.

 

O Parecer CRM-PR nº 2.708/2018 esclarece que "não há regulamentação específica no que diz respeito ao tempo prévio de conhecimento da instituição ou do diretor técnico para a troca destes plantões, podendo ser discutido no âmbito de cada instituição". Isso significa que cada instituição pode estabelecer suas próprias regras, desde que respeitados os princípios éticos fundamentais.


A Forma da Comunicação: Oral, Escrita ou Digital?


Outro aspecto prático importante refere-se à forma como a comunicação deve ser realizada. O artigo original menciona que "tal aviso pode ser oral, no entanto, recomenda-se a comprovação por escrito". Esta recomendação é extremamente prudente e merece ser enfatizada.

 

Em um mundo cada vez mais digital, onde as comunicações por WhatsApp, e-mail e aplicativos diversos se tornaram rotineiras, é fundamental que o médico plantonista mantenha registros adequados de suas comunicações. Uma simples mensagem de texto pode não ser suficiente para comprovar que a comunicação foi adequadamente realizada, especialmente em situações onde possa haver questionamentos posteriores.

 

A recomendação é que a comunicação seja feita preferencialmente por escrito, com confirmação de recebimento, dirigida simultaneamente ao diretor técnico da instituição, ao responsável pela escala de plantões e, quando aplicável, ao colega que o indicou para o plantão. Esta tríplice comunicação garante que a informação chegue a todos os responsáveis e reduz significativamente o risco de mal-entendidos ou falhas de comunicação.


Desistência Definitiva: Procedimentos e Prazos


A decisão de não mais participar das escalas de plantão de uma instituição é um direito legítimo do médico, mas deve ser exercida de forma responsável e respeitosa. Como bem observa o CRM-PR, "é direito do médico trabalhar onde lhe aprouver. Ninguém pode obrigá-lo a fazer o que não deseja. Contudo, existem normas para essa desistência, que partem da premissa não apenas da responsabilidade, mas também do respeito para com seus pares".

 

A questão do prazo para comunicação da desistência definitiva é particularmente importante. O Parecer CRM-PR nº 2.708/2018 sugere que "seja dado ao diretor técnico um prazo de pelo menos de trinta dias para a saída da escala, pois cabe a este a tarefa de preencher as vagas". Este prazo não é meramente sugestivo, mas reflete uma necessidade prática real: encontrar e integrar um novo médico à equipe de plantão demanda tempo, especialmente em especialidades com menor disponibilidade de profissionais.

 

Mas por que trinta dias? Este prazo permite que a direção técnica realize um processo adequado de seleção e integração do novo plantonista, incluindo a verificação de documentação, credenciamento junto aos órgãos competentes, integração às rotinas da instituição e, quando necessário, treinamento específico. Prazos menores podem comprometer a qualidade deste processo e, consequentemente, a segurança dos pacientes.


Responsabilidades Específicas e Situações Complexas


Uma das situações mais angustiantes para o médico plantonista ocorre quando seu horário de trabalho se encerra, mas o médico que deveria assumir o próximo plantão não comparece. Esta situação, infelizmente comum em muitos serviços, coloca o plantonista diante de um dilema ético e prático complexo.

 

O artigo 8º do Código de Ética Médica estabelece que é vedado ao médico "afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo temporariamente, sem deixar outro médico encarregado do atendimento de seus pacientes internados ou em estado grave". Esta disposição é clara: você não pode simplesmente abandonar pacientes sob seus cuidados, mesmo que seu horário de trabalho tenha terminado.

 

Mas como conciliar esta obrigação ética com seus direitos trabalhistas e com a necessidade de descanso? A resposta está na responsabilidade compartilhada mencionada anteriormente. Embora você não possa abandonar os pacientes, também não é sua responsabilidade exclusiva resolver a ausência do colega. Sua obrigação é comunicar imediatamente a situação à direção técnica e aguardar as providências necessárias.

 

O parágrafo único do artigo 9º do Código de Ética Médica é claro ao estabelecer que "na ausência de médico plantonista substituto, a direção técnica do estabelecimento de saúde deve providenciar a substituição". Isso significa que a responsabilidade de encontrar uma solução é da direção técnica, não sua. Sua responsabilidade é permanecer no local, prestando os cuidados necessários, até que a substituição seja providenciada.


Condições Inadequadas de Trabalho: Quando Recusar Atendimento?


Outro dilema frequente enfrentado por médicos plantonistas refere-se às situações em que as condições de trabalho são inadequadas ou inseguras. O artigo original menciona especificamente o caso de plantões de Ginecologia e Obstetrícia sem a presença de anestesiologistas e pediatras, mas esta situação pode se estender a diversas outras especialidades e contextos.

 

O artigo 7º do Código de Ética Médica estabelece que é vedado ao médico "deixar de atender em setores de urgência e emergência, quando for de sua obrigação fazê-lo, expondo a risco a vida de pacientes". Esta disposição cria uma tensão interessante: por um lado, o médico tem a obrigação de atender; por outro, não pode expor pacientes a riscos desnecessários.

 

A resolução desta tensão passa pela compreensão de que a obrigação de atender não é absoluta, mas deve ser exercida "dentro do possível", como menciona o artigo original. Em situações de urgência ou emergência, o médico deve prestar a melhor assistência possível com os recursos disponíveis, mas também deve trabalhar ativamente para transferir o paciente para uma instituição com melhores condições quando isso for necessário para a segurança do paciente.

 

É fundamental que todas estas situações sejam adequadamente documentadas e comunicadas à direção técnica. A documentação serve não apenas como proteção legal para o médico, mas também como ferramenta de melhoria da qualidade do serviço, permitindo que a instituição identifique e corrija deficiências estruturais.


A Questão da Sobrecarga: Limites Éticos e Legais


Um aspecto frequentemente negligenciado nas discussões sobre plantões médicos refere-se aos limites da sobrecarga de trabalho. Embora o médico tenha a obrigação ética de não abandonar pacientes sob seus cuidados, isso não significa que ele deva aceitar indefinidamente condições de trabalho que comprometam sua capacidade de exercer a medicina com segurança e qualidade.

 

A fadiga médica é um fator de risco reconhecido para erros médicos e comprometimento da qualidade do cuidado. Estudos demonstram que médicos excessivamente fatigados apresentam maior probabilidade de cometer erros de julgamento, têm reflexos diminuídos e capacidade de tomada de decisão comprometida. Portanto, a recusa em continuar trabalhando em condições de extrema fadiga pode, paradoxalmente, ser uma medida de proteção ao paciente.

 

Mas como determinar quando a fadiga atinge níveis que justificam a interrupção do trabalho? Esta é uma decisão complexa que deve levar em conta não apenas o estado físico e mental do médico, mas também a disponibilidade de alternativas e a gravidade dos casos sob seus cuidados. Em situações de dúvida, a comunicação com a direção técnica e a busca por orientação junto aos órgãos de classe são sempre recomendáveis.


Perguntas e Respostas: Esclarecendo Dúvidas Frequentes


1. O médico se isenta de infração ética sobre o plantão médico que não possa comparecer, caso avise o chefe responsável pela escala com antecedência?


Esta é uma das questões mais complexas e mal compreendidas no âmbito dos plantões médicos. A resposta simples é: não, a comunicação prévia, por si só, não isenta automaticamente o médico de responsabilidade ética. No entanto, esta resposta requer uma análise muito mais nuançada para ser adequadamente compreendida.

O artigo 9º do Código de Ética Médica estabelece que é vedado ao médico "deixar de comparecer a plantão em horário preestabelecido ou abandoná-lo sem a presença de substituto, salvo por justo impedimento". A expressão "salvo por justo impedimento" é a chave para compreender esta questão. A comunicação prévia é um elemento importante, mas não suficiente para caracterizar o justo impedimento.


Para que a ausência seja eticamente justificável, devem estar presentes simultaneamente três elementos: (1) a existência de um impedimento real e objetivo; (2) a impossibilidade de evitar ou contornar este impedimento através de meios razoáveis; e (3) a comunicação adequada e tempestiva às autoridades competentes.


A comunicação prévia demonstra boa-fé e responsabilidade profissional, permitindo que a direção técnica tome as providências necessárias para garantir a continuidade do atendimento. No entanto, se o motivo da ausência não configurar efetivamente um justo impedimento, a comunicação prévia pode atenuar, mas não eliminar completamente, a responsabilidade ética do médico.


É importante compreender que cada caso será analisado individualmente pelos órgãos competentes, levando em consideração não apenas a comunicação prévia, mas também a natureza do impedimento, as circunstâncias específicas da situação e as consequências para o atendimento aos pacientes.


Reflexões para a Prática:


• Você tem clareza sobre o que constitui um "justo impedimento" em sua prática profissional?

• Como você documenta e comprova situações que considera como força maior?

• Sua instituição possui protocolos claros para comunicação de ausências?


2. Caso haja cumprimento do período mínimo de comunicação prévia, como tal comunicação deve ser realizada?


A forma de comunicação é tão importante quanto o prazo, pois dela depende a efetividade da transmissão da informação e a possibilidade de comprovação posterior. Embora o artigo original mencione que "tal aviso pode ser oral", a recomendação de comprovação por escrito não é meramente sugestiva, mas reflete uma necessidade prática e legal fundamental.

 

A comunicação adequada deve observar os seguintes princípios:

 

Clareza e Precisão: A comunicação deve ser clara, precisa e completa, incluindo todas as informações relevantes: data e horário do plantão afetado, motivo da ausência, duração prevista do impedimento (se aplicável) e dados de contato para eventuais esclarecimentos.

 

Múltiplos Destinatários: A comunicação deve ser dirigida simultaneamente a todos os responsáveis: diretor técnico da instituição, responsável direto pela escala de plantões e, quando aplicável, o colega que o indicou para o plantão. Esta multiplicidade de destinatários garante que a informação chegue a todos os envolvidos e reduz o risco de falhas de comunicação.

 

Comprovação de Recebimento: É fundamental obter comprovação de que a comunicação foi recebida pelos destinatários. Isso pode ser feito através de confirmação de leitura em e-mails, protocolos de recebimento em comunicações físicas ou confirmação expressa em comunicações telefônicas.

 

Documentação Adequada: Mantenha cópias de toda a comunicação realizada, incluindo datas, horários, destinatários e conteúdo. Esta documentação pode ser fundamental em caso de questionamentos posteriores.

 

Meios de Comunicação Recomendados:


• E-mail institucional com confirmação de leitura

• Ofício protocolado na secretaria da instituição

• Comunicação através de sistemas institucionais específicos

• WhatsApp ou aplicativos similares (apenas como complemento, nunca como único meio)

Reflexões para a Prática:

• Você conhece os canais oficiais de comunicação de sua instituição?

• Mantém registros adequados de suas comunicações profissionais?

• Sua instituição possui sistemas que facilitam e documentam estas comunicações?


3. Com relação à não continuidade de plantões futuros, há um período mínimo de antecedência que o profissional médico deve avisar sua retirada definitiva para não ser mais indicado para as escalas dos plantões médicos?


Esta questão envolve um equilíbrio delicado entre o direito legítimo do médico de escolher onde trabalhar e a responsabilidade de fazê-lo de forma que não comprometa o funcionamento do serviço e a segurança dos pacientes. A resposta varia dependendo da natureza do vínculo do médico com a instituição.

 

Para Médicos sem Vínculo Empregatício Formal: Quando não há contrato de trabalho ou de prestação de serviços que estabeleça prazos específicos, o médico tem, em princípio, liberdade para retirar-se da escala a qualquer momento. No entanto, esta liberdade deve ser exercida com responsabilidade e bom senso.

 

O Parecer CRM-PR nº 2.708/2018 sugere um prazo mínimo de trinta dias para comunicação da saída definitiva da escala. Este prazo não é arbitrário, mas reflete necessidades práticas reais do processo de substituição: busca de novos profissionais, análise de currículos, verificação de documentação, credenciamento junto aos órgãos competentes e integração às rotinas da instituição.

 

Para Médicos com Vínculo Empregatício: Médicos com contrato de trabalho formal devem observar as regras da CLT ou, no caso do funcionalismo público, as normas específicas aplicáveis. Isso inclui o cumprimento do aviso prévio e demais obrigações contratuais.

 

Considerações Éticas Fundamentais:

 

Independentemente da natureza do vínculo, a decisão de retirar-se definitivamente da escala deve ser comunicada com a maior antecedência possível. Esta não é apenas uma questão de cortesia profissional, mas uma obrigação ética decorrente do princípio da responsabilidade para com os colegas e os pacientes.

 

A comunicação tardia ou inadequada da saída pode caracterizar falta de consideração para com os colegas, que podem ser sobrecarregados, e comprometer a qualidade do atendimento aos pacientes. Em casos extremos, pode até mesmo configurar infração ética passível de sanção pelos órgãos de classe.

 

Procedimentos Recomendados:

 

1. Comunicação formal por escrito ao diretor técnico

2. Cópia da comunicação ao responsável direto pela escala

3. Especificação clara da data a partir da qual não mais participará da escala

4. Oferecimento de colaboração para o processo de transição

5. Cumprimento integral dos plantões já assumidos até a data de saída

 

Reflexões para a Prática:


• Você conhece as regras específicas de sua instituição para saída da escala?

• Como você equilibra seus interesses pessoais com suas responsabilidades profissionais?

• Que impacto sua saída pode ter sobre seus colegas e sobre o atendimento aos pacientes?


4. A quem o médico deve comunicar a sua saída e a não continuidade nos próximos e futuros plantões médicos?


A comunicação adequada da saída definitiva da escala de plantões deve seguir uma hierarquia clara e abranger todos os responsáveis diretos e indiretos pela organização do serviço. Esta multiplicidade de destinatários não é burocracia desnecessária, mas uma garantia de que a informação chegue a todos os envolvidos e que as providências necessárias sejam tomadas.

 

Destinatários Obrigatórios:

 

Diretor Técnico da Instituição: É o responsável técnico máximo pela instituição e, portanto, o principal destinatário da comunicação. Cabe a ele a responsabilidade final pela organização das escalas e pela garantia da cobertura médica adequada do serviço.

 

Responsável Direto pela Escala de Plantões: Pode ser um coordenador médico, chefe de serviço ou outro profissional especificamente designado para esta função. É quem operacionalmente organiza as escalas e precisa da informação para reorganizar a distribuição dos plantões.

 

Colega que o Indicou (quando aplicável): Em muitos serviços, médicos são indicados por colegas já integrados à equipe. Nestes casos, é uma questão de cortesia e responsabilidade profissional comunicar também ao colega que fez a indicação.

 

Destinatários Recomendados:

 

Coordenação de Enfermagem: Embora não seja obrigatória, a comunicação à coordenação de enfermagem pode ser útil, especialmente em serviços onde há integração próxima entre as equipes médica e de enfermagem.

Administração Hospitalar: Em instituições onde há departamento específico de recursos humanos ou administração hospitalar, pode ser recomendável comunicar também a estes setores.

 

Forma e Conteúdo da Comunicação:

 

A comunicação deve ser formal, por escrito, e incluir:

 

• Identificação completa do médico (nome, CRM, especialidade)

• Data da comunicação

• Data a partir da qual não mais participará da escala

• Motivo da saída (opcional, mas recomendável)

• Confirmação do cumprimento dos plantões já assumidos

• Oferecimento de colaboração para o processo de transição

• Dados de contato para eventuais esclarecimentos

 

Comprovação e Documentação:


É fundamental manter comprovação de que a comunicação foi adequadamente realizada e recebida pelos destinatários. Isso pode incluir:


• Protocolo de recebimento em comunicações físicas

• Confirmação de leitura em e-mails

• Ata de reunião onde a saída foi comunicada

• Qualquer outro meio que comprove a comunicação


Reflexões para a Prática:


• Você conhece a estrutura hierárquica de sua instituição?

• Mantém relacionamento profissional adequado com todos os responsáveis?

• Como você documenta suas comunicações profissionais importantes?


5. Caso o médico já tenha concluído as horas do seu plantão médico em dia específico e não há novo médico que assuma o plantão no seu lugar, o plantonista pode se retirar do plantão?


Esta é uma das situações mais complexas e angustiantes enfrentadas por médicos plantonistas, pois coloca em tensão direitos trabalhistas legítimos e obrigações éticas fundamentais. A resposta categórica é: não, o médico não pode simplesmente se retirar, mas esta resposta requer uma análise cuidadosa das responsabilidades de cada parte envolvida.

 

Fundamento Ético:


O artigo 8º do Código de Ética Médica é claro ao estabelecer que é vedado ao médico "afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo temporariamente, sem deixar outro médico encarregado do atendimento de seus pacientes internados ou em estado grave". Esta disposição não faz distinção entre horário de trabalho e horário de folga; a obrigação ética é com os pacientes, não com o relógio.

 

Responsabilidade Compartilhada:

 

Embora o médico não possa abandonar os pacientes, é fundamental compreender que a responsabilidade pela solução do problema não é exclusivamente sua. O parágrafo único do artigo 9º do Código de Ética Médica estabelece que "na ausência de médico plantonista substituto, a direção técnica do estabelecimento de saúde deve providenciar a substituição".

 

Isso cria um sistema de responsabilidade compartilhada:

 

• Responsabilidade do Médico: Permanecer no local, prestando os cuidados necessários aos pacientes, até que a substituição seja providenciada

• Responsabilidade da Direção Técnica: Providenciar imediatamente a substituição, seja através de outro médico plantonista, seja assumindo pessoalmente a responsabilidade

 

Procedimentos Práticos:


Quando confrontado com esta situação, o médico deve:

 

1. Comunicação Imediata: Informar imediatamente à direção técnica sobre a ausência do substituto

2. Documentação: Registrar formalmente a situação, incluindo horário da comunicação, pessoas contatadas e providências solicitadas

3. Permanência Responsável: Permanecer no local, prestando os cuidados necessários, até que a substituição seja providenciada

4. Cobrança de Providências: Cobrar ativamente da direção técnica as providências necessárias para a substituição

5. Busca de Apoio: Quando necessário, buscar apoio junto aos órgãos de classe para orientação e eventual intervenção

 

Limites da Obrigação:

 

Embora a obrigação de permanecer seja clara, ela não é ilimitada. Em situações de extrema fadiga que possam comprometer a segurança dos pacientes, ou quando a direção técnica se mostra omissa em providenciar a substituição, o médico pode buscar orientação junto aos órgãos de classe e, em casos extremos, considerar medidas legais para proteção de seus direitos.

 

Consequências da Saída Irregular:

 

O abandono de plantão sem substituição adequada pode acarretar:

 

• Processo ético-disciplinar no Conselho Regional de Medicina

• Responsabilização civil por eventuais danos aos pacientes

• Responsabilização criminal em casos graves

• Demissão por justa causa (para médicos empregados)


Reflexões para a Prática:


• Como você se prepara para lidar com situações de ausência do substituto?

• Conhece os procedimentos de sua instituição para estas situações?

• Mantém contatos atualizados da direção técnica para comunicações de emergência?

• Como equilibra suas obrigações éticas com seus direitos trabalhistas?


6. O médico plantonista pode recusar atendimento alegando falta de condições adequadas de trabalho quando não há colegas médicos que possam lhe dar suporte, como em plantão de Ginecologia e Obstetrícia que não se fazem presentes anestesiologistas e pediatras disponíveis?


Esta questão toca no cerne de um dos dilemas mais complexos da medicina contemporânea: como equilibrar a obrigação de atender com a necessidade de garantir condições adequadas de trabalho e segurança para os pacientes. A resposta não é simples e requer uma análise cuidadosa de múltiplos fatores.

 

Princípios Éticos Fundamentais:

 

O artigo 7º do Código de Ética Médica estabelece que é vedado ao médico "deixar de atender em setores de urgência e emergência, quando for de sua obrigação fazê-lo, expondo a risco a vida de pacientes". Esta disposição cria uma tensão interessante: por um lado, há a obrigação de atender; por outro, há a proibição de expor pacientes a riscos.

 

A resolução desta tensão passa pela compreensão de que a obrigação de atender não é absoluta, mas deve ser exercida dentro dos limites da competência profissional e dos recursos disponíveis. O médico tem a obrigação de prestar a melhor assistência possível com os recursos disponíveis, mas também tem a responsabilidade de reconhecer suas limitações e buscar alternativas quando necessário.

 

Análise de Situações Específicas:

 

Urgências e Emergências: Em situações de urgência ou emergência, onde há risco iminente de vida, o médico deve prestar a assistência possível, mesmo em condições não ideais. A recusa de atendimento em situações de emergência pode configurar omissão de socorro e acarretar responsabilização ética, civil e criminal.

 

Procedimentos Eletivos: Para procedimentos eletivos ou não urgentes, o médico pode e deve recusar a realização quando as condições não forem adequadas. Nestes casos, a recusa não constitui abandono, mas exercício responsável da Medicina.

 

Situações Intermediárias: Para situações que não configuram emergência, mas requerem cuidados especializados não disponíveis, o médico deve trabalhar ativamente para transferir o paciente para instituição com melhores condições.

 

Procedimentos Recomendados:

 

Quando confrontado com condições inadequadas de trabalho, o médico deve:

 

1. Avaliação Cuidadosa: Avaliar cuidadosamente a situação clínica do paciente e a urgência do atendimento

2. Comunicação Clara: Comunicar ao paciente e familiares as limitações existentes e os riscos envolvidos

3. Busca de Alternativas: Trabalhar ativamente para transferir o paciente para instituição com melhores condições

4. Documentação Completa: Documentar detalhadamente toda a situação, incluindo as limitações identificadas, as comunicações realizadas e as providências tomadas

5. Comunicação à Direção Técnica: Informar formalmente à direção técnica sobre as deficiências identificadas

 

Responsabilidade Institucional:

 

É importante compreender que a responsabilidade por garantir condições adequadas de trabalho não é exclusiva do médico. A Resolução CFM nº 2.147/2016 estabelece que os gestores (diretor técnico e clínico) respondem ética e juridicamente pela adequação das condições de trabalho.

 

Isso significa que a instituição tem a obrigação de:

 

• Garantir a presença de profissionais especializados necessários

• Providenciar equipamentos e materiais adequados

• Estabelecer protocolos para transferência de pacientes quando necessário

• Manter condições físicas adequadas para o atendimento


Reflexões para a Prática:


• Como você avalia as condições de trabalho em sua instituição?

• Conhece os protocolos de transferência de pacientes de sua instituição?

• Como documenta situações de condições inadequadas de trabalho?

• Mantém comunicação adequada com a direção técnica sobre deficiências identificadas?


Responsabilização Ética: Processos no Conselho Regional de Medicina


O descumprimento das obrigações relacionadas aos plantões médicos pode acarretar processo ético-disciplinar no Conselho Regional de Medicina, com consequências que podem variar desde advertência até a cassação do exercício profissional. É fundamental compreender como estes processos funcionam e quais são os critérios utilizados para a aplicação das sanções.

 

Os Conselhos Regionais de Medicina analisam cada caso individualmente, levando em consideração diversos fatores: a gravidade da infração, as circunstâncias específicas da situação, os antecedentes do profissional, as consequências para os pacientes e a existência ou não de dolo ou culpa na conduta.

 

Tipos de Sanções Disciplinares:

 

Advertência Confidencial: Aplicada em casos de menor gravidade, especialmente quando há circunstâncias atenuantes ou quando se trata de primeira infração. A advertência fica registrada no prontuário do médico, mas não é divulgada publicamente.

 

Censura Confidencial: Sanção intermediária, aplicada em casos de gravidade moderada. Assim como a advertência, fica registrada no prontuário do médico, mas não é divulgada publicamente.

 

Censura Pública: Sanção mais grave, aplicada em casos de maior gravidade ou reincidência. É divulgada publicamente através dos meios de comunicação do Conselho Regional de Medicina.

 

Suspensão do Exercício Profissional: Aplicada em casos graves, com punição de 30 dias. Durante o período de suspensão, o médico fica impedido de exercer a medicina.

 

Cassação do Exercício Profissional: Sanção máxima, aplicada apenas em casos de extrema gravidade. Resulta na perda definitiva do direito de exercer a medicina.


Responsabilização Civil: Indenizações e Danos Materiais


Além das sanções disciplinares, o médico que abandona plantão pode ser responsabilizado civilmente por eventuais danos causados aos pacientes. Esta responsabilização pode resultar em obrigação de indenizar por danos materiais, morais e estéticos.


A responsabilidade civil médica é baseada na teoria da culpa, exigindo a comprovação de quatro elementos: conduta (ação ou omissão), dano, nexo causal entre a conduta e o dano, e culpa (negligência, imprudência ou imperícia). No caso do abandono de plantão, a conduta (omissão) e a culpa (negligência) são relativamente fáceis de comprovar; os elementos mais complexos são o dano e o nexo causal.

 

Tipos de Danos Indenizáveis:

 

Danos Materiais: Incluem gastos com tratamento médico adicional, medicamentos, internações, cirurgias e outros custos decorrentes do agravamento do quadro clínico do paciente.

 

Danos Morais: Relacionados ao sofrimento psíquico, angústia, dor e outros aspectos subjetivos decorrentes da situação.

 

Danos Estéticos: Quando há comprometimento da aparência física do paciente em decorrência do agravamento do quadro clínico.

 

Lucros Cessantes: Relacionados à perda de capacidade laborativa do paciente em decorrência do agravamento do quadro clínico.


Responsabilização Criminal: Omissão de Socorro e Outros Crimes


Em casos mais graves, o abandono de plantão pode configurar crime, especialmente quando resulta em morte ou lesão corporal grave do paciente. Os principais tipos penais aplicáveis são:

 

Omissão de Socorro (Art. 135 do Código Penal): "Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública."

 

Homicídio Culposo (Art. 121, §3º do Código Penal): Quando a omissão resulta em morte do paciente por negligência, imprudência ou imperícia.

 

Lesão Corporal Culposa (Art. 129, §6º do Código Penal): Quando a omissão resulta em lesão corporal do paciente por negligência, imprudência ou imperícia.

 

É importante compreender que a responsabilização criminal exige a comprovação do nexo causal entre a omissão e o resultado danoso, o que nem sempre é simples de estabelecer. No entanto, a mera possibilidade de responsabilização criminal deve ser suficiente para desencorajar qualquer conduta de abandono de plantão.


Prevenção de Problemas: Estratégias Práticas para o Médico Plantonista


A prevenção de problemas relacionados aos plantões médicos começa com uma organização pessoal e profissional adequada. Isso inclui:

 

Agenda Organizada: Mantenha uma agenda atualizada com todos os seus compromissos profissionais, incluindo plantões, consultas, cirurgias e outros compromissos. Use ferramentas digitais que permitam sincronização entre dispositivos e configuração de lembretes.

 

Comunicação Eficiente: Mantenha contatos atualizados de todos os responsáveis pela organização dos plantões em suas instituições. Tenha sempre à mão os telefones da direção técnica, coordenação de plantões e colegas que possam auxiliar em situações de emergência.

 

Documentação Sistemática: Desenvolva o hábito de documentar adequadamente todas as comunicações importantes relacionadas aos plantões. Isso inclui comunicações de ausência, mudanças de escala, problemas identificados e providências solicitadas.


Planejamento Antecipado: Sempre que possível, planeje com antecedência situações que possam afetar seus plantões, como viagens, compromissos familiares importantes, procedimentos médicos pessoais e outros eventos previsíveis.


O desenvolvimento de relacionamentos profissionais sólidos dentro das instituições onde trabalha é fundamental para a prevenção de problemas. Isso inclui:


Conhecimento da Estrutura: Familiarize-se com a estrutura organizacional da instituição, conhecendo os responsáveis por cada área e os canais adequados de comunicação.

 

Participação Ativa: Participe ativamente das reuniões e atividades da instituição, contribuindo para a melhoria dos processos e demonstrando comprometimento com a qualidade do serviço.

 

Comunicação Proativa: Mantenha comunicação regular com a direção técnica e coordenação de plantões, informando sobre problemas identificados e sugerindo melhorias.

 

Colaboração com Colegas: Desenvolva relacionamentos colaborativos com seus colegas, criando uma rede de apoio mútuo que pode ser fundamental em situações de emergência.


Por isso, mantenha-se atualizado sobre as normas e regulamentações que regem a prática dos plantões médicos:

 

Código de Ética Médica: Estude regularmente o Código de Ética Médica, especialmente os artigos relacionados à responsabilidade profissional e aos plantões.

 

Resoluções do CFM: Acompanhe as resoluções do Conselho Federal de Medicina relacionadas aos plantões médicos e às condições de trabalho.


Normas Institucionais: Conheça profundamente as normas internas de cada instituição onde trabalha, incluindo regimentos internos, protocolos de plantão e procedimentos administrativos.

 

A Prática Ética dos Plantões Médicos


Ao longo deste artigo, exploramos as múltiplas dimensões das responsabilidades relacionadas aos plantões médicos, desde os aspectos éticos fundamentais até as consequências legais mais severas. No entanto, é importante que esta análise não se limite aos aspectos normativos e punitivos, mas que nos leve a uma reflexão mais profunda sobre o significado da medicina como missão e profissão.

 

A medicina é, antes de tudo, uma profissão de cuidado. Quando escolhemos ser médicos, assumimos um compromisso que vai além dos aspectos técnicos e científicos da profissão. Assumimos a responsabilidade de cuidar de outros seres humanos em seus momentos de maior vulnerabilidade, quando a dor, o medo e a incerteza se fazem presentes de forma mais intensa.

 

Os plantões médicos representam uma das expressões mais puras desta missão de cuidado. É durante os plantões que nos deparamos com situações de urgência e emergência, onde nossas decisões e ações podem literalmente significar a diferença entre a vida e a morte. É nestes momentos que a responsabilidade médica se manifesta em sua forma mais intensa e onde a continuidade do cuidado se torna absolutamente fundamental.


Uma das questões mais complexas abordadas neste artigo refere-se ao equilíbrio entre os direitos legítimos do médico e seus deveres profissionais. Este equilíbrio não é estático, mas dinâmico, e requer uma avaliação constante das circunstâncias específicas de cada situação.

 

É importante reconhecer que o médico, como qualquer outro profissional, tem direitos trabalhistas legítimos: direito ao descanso, à remuneração adequada, a condições dignas de trabalho e à vida pessoal e familiar. Estes direitos não são incompatíveis com as obrigações éticas da profissão, mas devem ser exercidos de forma responsável e consciente.

 

Por outro lado, as obrigações éticas da medicina não são meramente formais ou burocráticas, mas refletem valores fundamentais que dão sentido e dignidade à nossa profissão. A responsabilidade para com os pacientes, o compromisso com a continuidade do cuidado e o respeito aos colegas são pilares que sustentam a confiança da sociedade na medicina.


A Importância da Comunicação e da Transparência


Um dos temas recorrentes ao longo deste artigo foi a importância da comunicação adequada em todas as situações relacionadas aos plantões médicos. Esta ênfase na comunicação não é casual, mas reflete uma compreensão fundamental: a maioria dos problemas e conflitos relacionados aos plantões médicos pode ser evitada ou minimizada através de comunicação clara, honesta e tempestiva.

 

A comunicação adequada demonstra respeito pelos colegas, pela instituição e, principalmente, pelos pacientes. Quando comunicamos adequadamente nossas limitações, impedimentos ou necessidades, permitimos que outros se organizem para garantir a continuidade do cuidado. Quando falhamos em comunicar, criamos situações de risco e desrespeito que podem ter consequências graves.

 

A transparência é outro valor fundamental que deve nortear nossa prática profissional. Ser transparente significa reconhecer nossas limitações, comunicar adequadamente nossas dificuldades e buscar soluções colaborativas para os problemas que enfrentamos. A transparência constrói confiança e facilita a resolução de conflitos.


Embora este artigo tenha focado principalmente nas responsabilidades do médico plantonista, é importante reconhecer que a qualidade dos plantões médicos depende também das instituições de saúde. As instituições têm a responsabilidade de criar condições adequadas para o exercício da medicina, incluindo:

 

Estrutura Física Adequada: Instalações apropriadas, equipamentos funcionais e materiais necessários para o atendimento de qualidade.

 

Dimensionamento Adequado: Número suficiente de profissionais para garantir a cobertura adequada dos plantões sem sobrecarga excessiva.

 

Remuneração Justa: Pagamento adequado e em dia, reconhecendo a responsabilidade e os riscos inerentes aos plantões médicos.

 

Apoio Institucional: Suporte administrativo, jurídico e técnico para os médicos plantonistas.

 

Educação Continuada: Programas de atualização e capacitação para manter os profissionais atualizados.

 

Quando as instituições falham em cumprir estas responsabilidades, criam condições que favorecem problemas e conflitos relacionados aos plantões médicos. Por isso, é fundamental que haja um diálogo constante entre médicos e gestores para a melhoria contínua das condições de trabalho.


A Medicina está em constante evolução, e os desafios relacionados aos plantões médicos também evoluem. Alguns dos principais desafios que enfrentamos atualmente incluem:

 

Escassez de Médicos: Em muitas regiões e especialidades, há escassez de médicos, o que aumenta a pressão sobre os profissionais disponíveis e pode comprometer a qualidade dos plantões.

 

Envelhecimento da População: O envelhecimento da população brasileira resulta em maior demanda por serviços de urgência e emergência, aumentando a pressão sobre os serviços de plantão.

 

Complexidade Crescente: Os casos atendidos nos plantões são cada vez mais complexos, exigindo maior especialização e recursos mais sofisticados.

 

Pressões Econômicas: As pressões econômicas sobre o sistema de saúde podem resultar em redução de recursos e piora das condições de trabalho.

 

No entanto, também há oportunidades importantes:

 

Tecnologia: O desenvolvimento de novas tecnologias pode facilitar a comunicação, melhorar a documentação e apoiar a tomada de decisões clínicas.

 

Telemedicina: A telemedicina pode permitir maior flexibilidade na organização dos plantões e facilitar o acesso a especialistas.

 

Educação Médica: Melhorias na educação médica podem preparar melhor os profissionais para os desafios dos plantões.

 

Regulamentação: O aperfeiçoamento da regulamentação pode criar condições mais claras e justas para o exercício dos plantões médicos.

 

Concluindo este extenso guia sobre as responsabilidades relacionadas aos plantões médicos, é importante reafirmar que o objetivo final de todas estas normas, regulamentações e orientações não é criar obstáculos ou dificuldades para o exercício da medicina, mas garantir a excelência do cuidado prestado aos pacientes.

 

A excelência na medicina não se alcança apenas através do conhecimento técnico ou da competência clínica, embora estes sejam elementos fundamentais. A excelência se constrói também através do compromisso ético, da responsabilidade profissional, do respeito aos colegas e da dedicação ao bem-estar dos pacientes.

 

Cada plantão médico é uma oportunidade de exercer esta excelência, de fazer a diferença na vida de pessoas que confiam em nosso conhecimento e dedicação. Cada decisão que tomamos, cada procedimento que realizamos, cada palavra que dirigimos aos pacientes e familiares é uma oportunidade de honrar a confiança que a sociedade deposita em nossa profissão.

 

As responsabilidades relacionadas aos plantões médicos, por mais complexas que possam parecer, são na verdade ferramentas que nos ajudam a exercer a medicina com maior segurança, qualidade e dignidade. Quando compreendemos profundamente estas responsabilidades e as incorporamos em nossa prática diária, não apenas nos protegemos de problemas legais e éticos, mas principalmente contribuímos para a construção de uma medicina mais humana, mais segura e mais eficaz.


Que este guia possa servir não apenas como fonte de informação, mas como instrumento de reflexão sobre o significado profundo de nossa missão como médicos. Que possamos sempre lembrar que, por trás de cada norma e regulamentação, está o objetivo fundamental de proteger e cuidar daqueles que mais precisam de nossa ajuda.


A medicina é uma profissão de privilégio e responsabilidade. Exercê-la com excelência é nossa obrigação ética e nossa contribuição para uma sociedade mais justa e humana.



Ricardo Stival é Advogado, Professor de Pós-Graduação de Direito Médico,  Especialista em Ações Judiciais de Erro Médico, Sindicâncias e Processos Éticos no CRM e CRO, com atuação em todo o Brasil
Ricardo Stival - Advogado de Direito Médico

Ricardo Stival - Advogado e Professor de Direito Médico

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